Aguia caçadeira encontra-se no limiar da extinção: revela o 1º Censo Nacional desta espécie

O censo nacional da águia-caçadeira (também conhecida como tartaranhão-caçador)  é da iniciativa do projeto Searas com Biodiversidade: Salvemos a Águia-caçadeira, uma parceria alargada entre o Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (BIOPOLIS-CIBIO) da Universidade do Porto, a Palombar – Conservação da Natureza e do Património Rural, o Clube de Produtores Continente e a Associação Nacional de Produtores de Cereais (ANPOC), que pretende apostar na valorização das searas em Portugal. O censo tem como objetivo gerar conhecimento de base para um projeto nacional de conservação da espécie, identificando os locais onde persiste e quantificando a sua abundância. Esta espécie de ave de rapina forma pequenas colónias e faz os ninhos no solo, sobretudo em campos de cereais, e está, portanto, dependente das práticas agrícolas.

"As estimativas anteriores mais recentes, de 2012, apontavam para uma população de 500 a 1000 casais”, refere João Gameiro, investigador do BIOPOLIS-CIBIO e coordenador nacional do censo. "Estas estimativas são grosseiras, mas a espécie era de facto muito mais abundante, sobretudo nas planícies agrícolas alentejanas”, acrescenta o investigador.

Depois de uma primeira avaliação em 2021 realizada pela equipa do projeto que sugeria um declínio dramático da espécie, foi organizado o primeiro censo nacional que envolveu mais de 15 entidades e perto de 200 observadores. Nos anos de 2022 e 2023, o número de casais de águia-caçadeira foi estimado em 267 quadrículas de 10x10km. De destacar o papel fundamental do ICNF, que contribuiu com mais de 100 técnicos/observadores, contribuindo para cobrir a quase totalidade do habitat potencial para a espécie no território nacional. 

Os resultados são agora conhecidos: em 2022 e 2023 a população portuguesa da águia-caçadeira foi estimada em 119-207 casais. "Estamos perante um declínio muito acentuado, de 76 a 79% em apenas 10 anos, o que prova que a espécie se encontra a caminho da extinção, caso não sejam implementadas medidas de emergência eficazes de conservação”, alarma João Paulo Silva, também investigador do BIOPOLIS-CIBIO e coordenador sénior do projeto. "Este declínio é alarmante e está fortemente ligado às alterações nas práticas e políticas agrícolas em Portugal, como aliás já tem sido demonstrado para outras espécies de aves agrícolas prioritárias, como o sisão. 

Se compararmos a nova distribuição da espécie com os ATLAS de distribuição anteriores, é precisamente no Alentejo que se verificam os declínios mais acentuados. A substituição de cereais para grão por fenos para alimentar o gado resulta em ações de corte da cultura muito mais antecipadas, colocando em risco os ninhos.”

"Mesmo na zona de Trás-os-Montes é evidente a contração e fragmentação da população”, acrescenta Luís Ribeiro, técnico superior da Palombar. "Monitorizámos colónias grandes em 2022 que simplesmente desapareceram em 2023. Se morreram durante as ações de corte de fenos, ou se se deslocaram para outras áreas, como Espanha, é algo que ainda temos de aferir”.

"O forte declínio e contração da distribuição, associado à perda de habitat e destruição de ninhos, ameaça que ainda não foi revertida, coloca a espécie na categoria de conservação mais grave de "Criticamente em Perigo”, refere José Pereira, presidente da Palombar. 

Este censo coloca em evidência a necessidade de se implementarem medidas urgentes para a salvaguarda da espécie, o que passa necessariamente pela disponibilização e proteção de searas para grão, que corresponde ao seu habitat de nidificação mais importante.

Imagem 1. Águia-caçadeira | Créditos de imagem: Carlos Pacheco

Imagem 2.  Esforço de cobertura do censo

Imagem 3.  Comparação da distribuição com ATLAS

Imagem 4.  Número de casais de Águia-caçadeira por distrito