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O valor de conservação das estações de campo de investigação é mal compreendido e subfinanciado

O valor de conservação das estações de campo de investigação é mal compreendido e subfinanciado
O financiamento de estações de campo de investigação em biologia da conservação foi drasticamente reduzido em todo o mundo desde o início da pandemia da COVID-19, o que desperta preocupação a mais de 170 investigadores da área temática, representando 157 estações de campo de investigação em 56 países, num novo artigo publicado na prestigiada revista científica Conservation Letters

Os autores afirmam que as estações de campo de investigação têm um elevado retorno sobre o investimento e são ferramentas essenciais e altamente eficazes para a conservação da biodiversidade.

Foram mobilizados biliões de dólares americanos na recuperação económica após a pandemia, mas os autores mencionam que os recursos para fazer face à perda de biodiversidade e às crises climáticas tenham sido limitados quando são mais urgentemente necessários. A pandemia fez com que cerca de metade das estações de campo inquiridas no estudo cessassem parcialmente as suas atividades, e cerca de um quarto tenha permanecido parcial ou totalmente fechadas, com a maioria das estações de campo a registar uma redução total no financiamento.

Timothy Eppley, primeiro autor do estudo, principal diretor da organização Wildlife Madagascar e previamente, um investigador pós-doutoral no San Diego Zoo Wildlife Alliance refere: "um desafio fundamental é que os governos e as agências de financiamento não estão a contabilizar o verdadeiro retorno do investimento em conservação e não percebem o papel econômico crítico dos serviços dos ecossistemas que são protegidos por essas estações de campo.”

Eppley e coautores sugerem que o trabalho das estações de campo de investigação é muitas vezes interdisciplinar, e alguns dos benefícios diretos e indiretos da investigação, educação e envolvimento do público que ocorrem em estações de campo têm objetivos de longo prazo que os modelos atuais de análise de custo/beneficio não capturam.

"As estações de campo funcionam muitas vezes de forma autónoma, e poucos estudos exploraram o impacto agregado do seu trabalho. Cumulativamente, as estações de campo dão uma contribuição substancial para a conservação”, indica Eppley.

Russ Mittermeier, o Diretor para a Conservação da Re:wild e autor sénior do artigo, compartilhou um sentimento semelhante, dizendo: "As estações de campo de investigação são uma ferramenta multifacetada com um bom custo-benefício para abordar desafios globais de conservação e não apenas locais onde investigação esotérica é realizada, como muitas vezes se pensa. Quase invariavelmente, encontram-se maiores densidades de vida selvagem nas proximidades destas estações de campo do que em outras partes de uma determinada região, mesmo dentro de áreas protegidas.”

O estudo consistiu num inquérito, que se focou em estações de campo principalmente em países tropicais e subtropicais, com o objetivo principal de se compreender o impacto da pandemia no financiamento e avaliar os benefícios das estações de campo para a conservação. 

Os resultados sugerem uma melhor qualidade do habitat das áreas circundantes através da redução da desflorestação nas proximidades das estações de campo, a redução das taxas de caça e a melhoria da aplicação das leis relativas à utilização da vida selvagem e à extração de recursos naturais. Além disso, 93% das estações de campo contratam elementos das comunidades locais, apoiando a economia local, além de gerarem produção científica significativa que informa políticas de conservação da natureza.

Os autores defendem maior reconhecimento e investimento em estações de campo de investigação. "Os benefícios do apoio a estas estações de campo vão além da preservação da biodiversidade, abrangendo o avanço da investigação científica, da educação e do desenvolvimento da comunidade local”, refere Mittermeier.

"A nossa investigação sublinha uma necessidade crítica de um maior apoio às estações de campo de investigação para garantir a sua capacidade de continuar o seu trabalho indispensável. Não incluir as estações de campo nos quadros políticos internacionais que abordam a crise global da biodiversidade representa uma oportunidade perdida”, refere Eppley.

Maria Joana Ferreira da Silva, investigadora associada ao BIOPOLIS-CIBIO, uma dos 170 investigadores inquiridos e coautora do artigo afirma: "Neste momento critico, em que mais de metade dos primatas não-humanos se encontram ameaçados de extinção, torna-se necessário usar todas as ferramentas ao nosso dispor para evitar a enorme crise de conservação que se espera nas próximas décadas. As estações de campo de investigação são uma ferramenta importantíssima para a conservação da biodiversidade e dos primatas em particular já funcionam de forma independente dos governos dos países, muitas vezes continuando a funcionar mesmo durante e após momentos de instabilidade política e baixa governança. Para além disso, as estações de campo complementam os benefícios para a conservação da natureza provida pelos parques naturais, ao aumentarem a vigilância contra atividades relacionadas com a desflorestação e caça ilegal, para além de contribuírem com novo conhecimento científico e ajudarem ao desenvolvimento humano e económico. Os governos e as agências de financiamento precisam tomar consciência da importância destas estações de campo e apoiarem as suas atividades, quer seja do ponto de vista financeiro como logisticamente.


Artigo:
Eppley, T. M., Reuter, K. E., Sefczek, T. M., Tinsman, J., Santini, L., Hoeks, S., Andriantsaralaza, S., Shanee, S., Fiore, A. D., Setchell, J. M., Strier, K. B., Abanyam, P. A., Mutalib, A. H. A., Abwe, E., Ahmed, T., Ancrenaz, M., Andriantsimanarilafy, R. R., Ang, A., Aureli, F., … Mittermeier, R. A. (2024). Tropical field stations yield high conservation return on investment. Conservation Letters, e13007.


2024-03-05
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