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Porque é que existem aves vermelhas?

Porque é que existem aves vermelhas?

Num artigo publicado hoje online pela prestigiada revista científica Current Biology, uma equipa de investigação internacional que inclui Miguel Carneiro, Ricardo Jorge Lopes e José Melo-Ferreira, investigadores do CIBIO-InBIO, Universidade do Porto, desvenda as bases genéticas que explicam porque é que algumas aves são vermelhas.


Esta descoberta, que surge no contexto da colaboração dos investigadores portugueses com duas equipas internacionais lideradas por Geoffrey Hill, da Auburn University, nos EUA, e Joseph Corbo, da Washington University School of Medicine, também nos EUA, foi possível graças à utilização das mais recentes ferramentas de análise genética e de genomas.

 

Qual foi principal descoberta proporcionada por este estudo?
Para ter penas vermelhas algumas espécies de aves convertem pigmentos amarelos (carotenóides) em pigmentos vermelhos, que são incorporados nas penas durante o seu crescimento. Estes pigmentos vermelhos também são incorporados nos cones - células receptoras de luz existentes no olho – aumentando assim o reconhecimento das cores. Neste estudo, a equipa de investigadores conseguiu identificar o gene (CYP2J19) que codifica a proteína (enzima) que permite a conversão dos pigmentos amarelos em vermelhos.

 

Mas qual é a importância desta descoberta?
Em muitas espécies animais a selecção sexual está associada com a cor vermelha. O sucesso reprodutor de um dado animal poderá ser maior se este tiver mais penas vermelhas ou penas com vermelhos mais intensos. Assim, “… a identificação do gene que é responsável pela existência de pena vermelhas nas aves é uma descoberta muito importante para se compreender a função e evolução da cor vermelha nos animais em geral”, explica Miguel Carneiro, o investigador que coordenou este estudo.

 

E como chegaram a estes resultados?
Segundo Ricardo Jorge Lopes, primeiro autor do artigo agora publicado, “só foi possível encontrar os genes que são necessários para a produção de penas vermelhas porque existem raças de canário doméstico com diferentes cores (amarelos e vermelhos) e porque, devido aos recentes desenvolvimentos tecnológicos na área da genómica, é finalmente possível conhecer todo o genoma de um indivíduo”. A existência de três equipas de investigação, independentemente especializadas nos mecanismos genéticos da coloração nas penas e nos olhos de aves, foi fundamental para o sucesso deste estudo. Este enquadramento promoveu uma colaboração muito eficiente que permitiu identificar estes genes muito rapidamente.

 

Mas como conseguiram os investigadores descobrir os genes mais importantes?
Há menos de cem anos, criadores de canários cruzaram uma espécie com penas vermelhas, o Cardinalito da Venezuela, com canários domésticos e conseguiram criar o primeiro canário vermelho, uma feito notável, tendo em conta que nem se sabia as bases moleculares da genética. Neste estudo, os investigadores comparam o genoma destes canários vermelhos com o genoma dos canários amarelos e dos cardinalitos da Venezuela e identificaram as regiões do genoma que foram herdadas a partir do Cardinalito da Venezuela e que são responsáveis pela cor vermelha das penas.

 

E quanto a descobertas surpreendentes: alguma a registar?
“Há duas descobertas surpreendentes no nosso estudo”, refere Miguel Carneiro. “Primeiro, verificámos que o gene (CYP2J19), necessário para que as aves possam ter penas vermelhas, está presente em todos os genomas de aves diurnas, não só nas aves com penas vermelhas”. Em geral, este gene é aparentemente utilizado na retina para incorporar pigmentos vermelhos nas células receptoras de cor, que permitem aos animais aumentar a sua visão das cores. “Contudo”, acrescenta Miguel, “nas aves com penas vermelhas, este gene também é utilizado para produzir as penas vermelhas. Isto sugere que a maioria das aves tem a capacidade latente de produzir penas vermelhas, mas para isso acontecer é necessária a evolução de mecanismos ao nível da regulação génica que permitam utilizar este gene também nas penas”.
A segunda descoberta, declara Miguel, “é que também é necessária a presença de um outro gene para promover o crescimento das penas vermelhas. Mas ainda não sabemos como este gene interage com o gene CYP2J19 para permitir que as penas cresçam vermelhas”.

 

Qual a mensagem que podemos levar deste estudo?
Os resultados obtidos neste estudo revelam que com as mais recentes tecnologias de análise de genomas temos finalmente em mãos as ferramentas que nos permitem deslindar as bases genéticas da biodiversidade do mundo natural. Tal como Ricardo Jorge Lopes o coloca, “quando uma criança curiosa pergunta porque razão o seu canário é vermelho, podemos finalmente saciar-lhe essa curiosidade!”

 

E quais serão os próximos passos para esta investigação?
Antes de mais, os investigadores pretendem identificar o mecanismo genético que permite ao canário vermelho expressar na pele o gene CYP2J19, responsável pela deposição dos corantes vermelhos nas penas. De seguida, tendo em conta que existem mais de 10 000 espécies de aves, muitas com penas vermelhas, é necessário verificar se o mecanismo genético que descobriram é comum à maioria destas espécies. A longo prazo, avança Miguel “… continuarão a utilizar o canário doméstico como um excelente modelo para descobrir a base genética de muitas outras características fascinantes, que também existem em muitas espécies de aves selvagens!”

 

 

Artigo Original:
Lopes RJ, Johnson JD, Toomey MB, Ferreira MS, Araujo PM, Melo-Ferreira J, Andersson L, Hill GE, Corbo JC, Carneiro M (2016) Genetic Basis for Red Coloration in Birds. Current Biology 26, 1–8
Disponível em: //dx.doi.org/10.1016/j.cub.2016.03.076

 

 

2016-05-19
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