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Os vírus também podem ser uma grande ajuda no tratamento de cancros

Os vírus também podem ser uma grande ajuda no tratamento de cancros
Investigadores portugueses mostram que um importante mecanismo de defesa para matar células infetadas por vírus ter-se-á perdido em alguns grupos de mamíferos.

Num artigo publicado recentemente pela prestigiada revista "Frontiers in Immunology”, uma equipa multidisciplinar luso-americana liderada por investigadores do CIBIO-InBIO (Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos, InBIO Laboratório Associado da Universidade do Porto), em colaboração com investigadores do CIIMAR (Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental, também da Universidade do Porto), e com investigadores da Universidade do Arizona, USA, mostrou, que a necroptose, uma importante via para eliminar vírus e outros agentes patogénicos ter-se-á perdido em vários grupos de mamíferos em diferentes alturas.

Quando uma célula humana ou animal é invadida por um vírus ou outro agente patogénico, os organismos hospedeiros possuem mecanismos de resposta. A necroptose é um desses mecanismos, contribuindo para uma resposta imunitária que mata as células infetadas com vírus e outros agentes patogénicos. A indução da necroptose é feita através da interação de duas proteínas, o RIPK3 e a MLKL que induzem a rutura da membrana plasmática celular e originam a morte celular.

Ana Pinto, aluna de Doutoramento da Universidade do Porto e primeira autora do artigo, refere que a análise destas duas moléculas em dezenas de espécies de mamíferos revelou, surpreendentemente, que estes "dois genes apresentavam múltiplas mutações que inativavam estes genes em várias linhagens de mamíferos.” Curiosamente, também foi encontrada uma forte correlação entre a interrupção da necroptose em coelhos, lebres e cetáceos e a ausência do domínio N-terminal em poxvírus (responsáveis pela inibição da necroptose) que afetam mortalmente os coelhos, as lebres e os cetáceos.

Filipe Castro, investigador do CIIMAR, refere a importância deste artigo como sendo o primeiro grande estudo evolutivo desta importante via de defesa nos mamíferos. A perda de necroptose várias vezes durante a evolução dos mamíferos parece estar ligada à adaptação das espécies e sugere que esta via para eliminar vírus não é necessária para os mecanismos de defesa convencionais dos mamíferos. 

Para Pedro Esteves, líder do grupo de investigação Imunologia e doenças Emergentes (IMED) do CIBIO-InBIO e autor sénior desta publicação, este estudo sugere uma relação coevolutiva entre os poxvírus e seus hospedeiros, enfatizando o papel da adaptação do hospedeiro na evolução do vírus. A perda destes genes em quatro grupos distintos de mamíferos em diferentes momentos, sugere que essa perda terá surgido como uma vantagem para estas espécies. Uma das hipóteses é que estas espécies possam ter criado vias alternativas para originar novas vias necroptícas. Este autor adianta ainda: "curiosamente nestas espécies existem fortes evidências que a existência de tumores oncológicos seja muitíssimo rara. Por isso, é bastante tentador relacionar a perda da via necróptica com uma maior infeção viral que levasse a que estes vírus pudessem evitar cancros!”.

Nos dias que correm em que os vírus se tornaram o grande tema das nossas vidas, não deixa de ser curioso que os vírus possam ter sido no passado importantes no controle de desenvolvimento de cancros. Na verdade, a utilização de vírus como possíveis agentes oncolíticos no tratamento de cancros tem vindo a ganhar força. Por exemplo, resultados laboratoriais mostraram que vírus mixoma que afeta mortalmente os coelhos e lebres poderá no futuro ser usado como estratégia terapêutica de cancros em humanos.

Este trabalho foi financeiramente suportado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT, Portugal) através da atribuição de uma bolsa de doutoramento à investigadora Ana Pinto (ref.SFRH/BD/128752/2017), a um contracto de investigador Principal ao investigador sénior Pedro Esteves (IF/00376/2015) e a um projeto de investigação UIDB/50027/2020 (Base).


Artigo original: 
Águeda-Pinto A, Alves LQ, Neves F, McFadden G, Jacobs BL, Castro LFC, Rahman MM and Esteves PJ (2021) Convergent Loss of the Necroptosis Pathway in Disparate Mammalian Lineages Shapes Viruses Countermeasures. Front. Immunol. 12:747737.
DOI: 10.3389/fimmu.2021.747737

2021-09-07
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